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Desde o seu início em 2007, este blog evoluiu
e hoje, quase exclusivamente,
ocupa-se com a reflexão sobre a vida de um homossexual,
no contexto de sua fé católica.



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13 de outubro de 2013

O antidepressivo chamado gratidão

 
A palavra "depressão" tem vários significados. Além de ser o nome de um distúrbio mental, altamente debilitante, a ponto de ser considerado por muitos como o “mal do século”, o termo é usado no estudo de geografia (uma região da superfície da Terra cuja altitude é mais baixa que a região à sua volta. Quando esta região situa-se numa altitude abaixo do nível do mar, ela é chamada de depressão absoluta), meteorologia (uma zona da atmosfera onde a pressão atmosférica é mais baixa que à sua volta) e economia (longo período de estagnação econômica mais prolongado e severa do que uma recessão). Para quem não é um perito em psicologia/psiquiatria, em geografia, nem meteorologia/climatologia (tipo: eu), a imaginação leva a visualizar uma linha que marca o "nível zero". Logo, aquilo que estiver abaixo dessa linha, está em depressão.
 
Acredito na existência de uma depressão espiritual/intelectual/social que talvez não seja uma doença, mas consiste em uma séria limitação do horizonte existencial, ou seja, da percepção que temos de nós mesmos e do mundo em nossa volta. Uma das áreas mais prejudicadas é a dimensão espiritual (ou religiosa) e a outra, sem dúvida, é a nossa convivência com os demais seres humanos. Basicamente, trata-se de uma espécie de "deslocamento" dos valores para baixo. A nossa cultura/mentalidade é, de modo geral, malcontente. A nossa mídia é negativista. As nossas conversas revelam, em sua maior parte, a grande insatisfação com tudo e com todos. Perdemos a capacidade de enxergar o bem, porque o bem passou a ser visto como o "nível zero". E o zero não merece atenção, é apenas normal. É como o ar com o qual respiramos, mesmo sem percebê-lo. A consequência imediata dessa situação é uma falta de gratidão, quase absoluta. Provavelmente, até a palavra usada para expressar a gratidão, tenha sido contestada, por se associar à obrigação que, por sua vez, é a maior inimiga do relativismo vigente.
 
Atenção! Eu não estou pregando um "lulismo-paz-e-amor" barato, nem pretendo anestesiar a sensibilidade para com os males que assolam o nosso mundo. Denunciar o mal, lutar contra as injustiças, apontar os problemas... não tem nada a ver com a depressão cultural. É, antes, um ato de coragem, um sinal de boa vontade, enfim... é tudo de bom. O que estou tentando dizer é que, talvez devido à epidemia do mal e à sua ampla divulgação, tenhamos perdido a noção daquilo que é positivo, precioso, enriquecedor, o que torna a nossa vida melhor, o que nos faz crescer e, finalmente, desperta(ria) em nós a gratidão.
 
Os textos bíblicos da liturgia de hoje falam sobre isso. A questão de gratidão/ingratidão está mais nítida no Evangelho (Lc 17, 11-19): Enquanto caminhavam, aconteceu que ficaram curados. Um deles, ao perceber que estava curado, voltou glorificando a Deus em alta voz; atirou-se aos pés de Jesus, com o rosto por terra, e lhe agradeceu. E este era um samaritano. Então Jesus lhe perguntou: “Não foram dez os curados? E os outros nove, onde estão?". O mesmo tema, frisando mais a gratidão (sem mencionar o lado oposto), apresenta o texto da I leitura (2Rs 5, 14-17). O sírio Naamã, já surpreendido pela simplicidade da graça de Deus, desdobra-se ao procurar a melhor maneira para agradecer pela cura. Descobre, finalmente, que a melhor forma de agradecer a Deus é o culto prestado a Ele. A ideia continua no Salmo (Sl 97): O Senhor fez conhecer a salvação e às nações, sua justiça; recordou o seu amor sempre fiel pela casa de Israel. Paulo, na segunda leitura (2Tm 2, 8-13), conclui com um conselho e um desabafo: Lembra-te de Jesus Cristo (...), suporto qualquer coisa.
 
Confesso que me entristece o fato de ver/ler/ouvir tantas declarações de agnosticismo e ateísmo (explícitos), de menor ou maior distanciamento dessa ou daquela religião, feitas pelos representantes do "mundo GLBTTS". Tudo bem, a ação gera a reação. Sinto, porém, por trás dessa contestação, aquela lógica da depressão cultural.  Por mais que alguém diga que tenha abandonado a instituição religiosa e não o próprio Deus, a direção continua a mesma. É possível pensar assim: "Eu abandono um «deus» que me foi transmitido pela Igreja e vou procurar o Deus verdadeiro". Se for realmente isso, tudo bem, mas na prática, abandona-se a religião e se esquece de Deus, ou não se acredita mais nem na sua existência.
 
Lembro-me de uma senhora que, em certa época, era a minha vizinha. Ela, desde a infância, tinha um grave defeito nos pés que não lhe permitia andar. A mulher vivia acamada, mas não me lembro de ter conhecido a pessoa que fosse mais alegre e otimista. Ela vivia louvando e agradecendo a Deus. Várias pessoas iam lá, na casa dela, para receber (não para dar!) o conforto em seus problemas e ela levava todo mundo à oração, à leitura da Bíblia e ao louvor. Muita gente saía de lá com a motivação renovada para agradecer a Deus.
 
Consciente de toda intolerância, homofobia, rejeição familiar e social e de tudo o mais que afeta a vida das pessoas GLBTT, pergunto: nós, de fato, não temos nenhum motivo para agradecer a Deus? O que somos e temos, consideramos - simplesmente - como o "nível zero" e o resto como "abaixo de zero"? Será que não podemos descobrir a gratidão (a Deus, às pessoas), como o antídoto para depressão? Eu sou capaz de dizer: "Agradeço a Deus pelo fato de eu ser gay"?

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