ESTE BLOG NÃO POSSUI CONTEÚDO PORNOGRÁFICO

Desde o seu início em 2007, este blog evoluiu
e hoje, quase exclusivamente,
ocupa-se com a reflexão sobre a vida de um homossexual,
no contexto de sua fé católica.



_____________________________________________________________________________



13 de novembro de 2013

Postagem interativa

No estilo soft (ou light, quem quiser), afinal estou de férias, proponho hoje uma imagem sem comentários, mas para ser comentada, se algum dos meus Ilustres Leitores, assim quiser. É de um humorista polonês Andrzej Mleczko (vejam a sua página no face). Eu apenas alterei o idioma do texto.
 
 

11 de novembro de 2013

Uma pausa

(Foto: fonte)
 
Chegou a hora de descansar um pouco e já estou viajando (esta postagem foi programada para ser publicada nesta data, mas não estou, no momento, em casa). Os lugares que estou visitando são lindos e um tanto afastados da civilização. Não tenho o acesso diário à net, mas prometo, de vez em quando, dar um "olá" aqui, talvez com algumas novidades.
 
Bem... Os meus sonhos ainda não se realizaram. Algumas decisões existenciais foram adiadas um pouco, mas vejo nisso tudo a Providência de Deus. Foi sobre isso que conversei com os meus amigos ontem no bar. Todos estavam de acordo com a ideia de que as decisões desse porte (aquelas existenciais), não fossem o fruto de um impulso. A fé na Providência de Deus não justifica a imprudência. Tipo: "largar tudo", OK... e depois? Deus providenciará? Mas Ele já providenciou a minha inteligência, a experiência de algumas décadas de vida e o exemplo daqueles que quebraram a cara, só porque não se preocuparam com o futuro. Quando Jesus fala sobre isso no Evangelho, usa a expressão "preocupações desmedidas", o que sugere que outras, aquelas "medidas", sejam boas e importantes.
 
Enfim... Queria encontrar o "meu coreano" (que, perfeitamente, pode ser um brasileiro, desde que seja meu). Queria namorar, noivar, casar, viver junto, cuidar (dele), trabalhar, ser feliz (com ele). Aliás, foi essa a pergunta que uma das amigas me fez ontem: "E agora, com tudo o que você faz, você não está feliz?". Lembro-me (apesar de ter sido na hora da terceira caipirinha) que, como resposta, eu tinha feito um gesto com as mãos, como se quisesse pegar algo. Se não me engano, respondi: "Sim, estou feliz, mas estou procurando uma felicidade mais palpável"... Por mais que alguém possa interpretar isso assim, não se trata apenas de "apalpar a carne". É a questão de ter alguém - como diz aquela famosa frase - quem pudesse chamar de meu (e de ser assim chamado também). Sim! De poder tocar também!
 
OK. Espero ter ótimas férias e poder retornar com novas forças e novas ideias, daqui a um mês.
 
Um beijo para todos!

9 de novembro de 2013

Um tom diferente

Não sei se esse fenômeno é um dos efeitos diretos do estilo (e do discurso) do Papa Francisco, mas quem costuma acompanhar os pronunciamentos dos bispos católicos, aqui no Brasil, pode notar uma suave mudança de tom. É claro, ainda não desapareceram os gritos no estilo inquisitório, mas surgem, também, as mensagens conciliadoras e - digamos - expiatórias. A confissão de culpa histórica (e atual), feita em nome de uma instituição, ainda que pelo dirigente de um nível intermediário, anima e traz a esperança. Afinal, é na tradição católica que temos o "propósito de emenda", logo depois de um "arrependimento". Quem, por sua vez, acompanha os discursos do Santo Padre, vai encontrar facilmente o eco de suas palavras no texto a seguir. É um dos artigos, publicados no site da CNBB, escrito pelo Bispo de Jales (SP), Dom Demétrio Valentini. Antes de transcrever as suas palavras, quero lembrar aqui de que foi o Dom Demétrio que, em 2010, criticou o fundamentalismo de muitos religiosos, no contexto da briga pelo 3° Plano Nacional de Direitos Humanos. De acordo com a "Folha de São Paulo", parte dos religiosos (reunidos em maio de 2010 em Brasília, na 48ª Assembleia Geral da CNBB) não aceitava que o plano de direitos humanos tratasse de questões como a profissionalização de prostitutas, a adoção de crianças por pessoas do mesmo sexo e a união civil gay. Diante disso, Dom Demétrio disse: "Tenho esperança de que prevaleça o bom senso. Tenho a esperança de que não vamos fazer um documento marcado pelo fundamentalismo".
 
 
 
No artigo "O horizonte da missão", publicado (no dia 17 de outubro deste ano) na página oficial da CNBB, Dom Demétrio escreve, entre outras coisas, o seguinte:
 
Na história houve, certamente, alguns equívocos sérios em torno da Evangelização. Dá para fazer uma importante constatação: quando a Igreja fez da evangelização uma “conquista”, impondo sobre os povos um domínio cultural e político, ela confiou no seu poderio humano, e não na força libertadora do Evangelho. Assim fazendo, ela não anunciou o Evangelho livremente, como São Paulo. Mas cobrou uma pesada conta, nem tanto em benefícios que ela recebeu, mas no prejuízo que ela provocou nos povos, a quem ela anunciou um “evangelho” deformado pela submissão exigida dos povos “conquistados”.
 
Quando a Igreja não se deixa converter pelo Evangelho que ela prega, ela acaba se pervertendo a si mesma, e aos povos por ela “submetidos” a um evangelho deturpado.
 
É diante da missão que a Igreja experimenta a absoluta necessidade de continuar se convertendo. Assim, a missão, voltada para fora da Igreja, acaba se voltando para a própria Igreja, que se torna, também ela, destinatária do Evangelho de Cristo.
 
De tal modo que, na Igreja, o chamado vem sempre ligado ao envio, a comunhão é sempre vinculada à missão. Assim a Igreja é sempre estimulada a levar aos outros o que ela mesma vive. O Evangelho anunciado precisa ser um Evangelho vivido.

7 de novembro de 2013

Landro Carioca


Finalmente fui conhecer o "Landro Carioca". Eu que não sou muito dado a baladas, gostei do lugar. Até idealizei um pedido de namoro/noivado/casamento (caso encontre um candidato), quem sabe, também por lá. Desta vez foi a primeira visita, um tipo de "espionagem", só para conhecer o ambiente. Em breve pretendo voltar lá. Ainda não sei qual é a situação do Landro Carioca nos fins de semana (fui na quarta - estava praticamente vazio). Os anúncios, publicados pelo próprio bar, advertem: Fiquem ligados! A programação dos fins de semana de Novembro, no Landro Carioca, está fuderosa! A casa vai ficar pequena para tanta gente. Confirme sua participação e chegue cedo pois a casa tem um limite de lotação!
 
Fiquei na dúvida em questão do nome deste bar. Quando falei sobre o local com alguns amigos, todos me perguntavam se não era o "Leandro". É Landro mesmo. O engraçado é que no "dicionário informal", "landro" consta como uma protuberância indicativa de inflamação que surge nas laterais do pescoço (certamente, não tem nada a ver com o bar... ou tem?). A intuição me levou ao outro vocábulo, um tanto parecido e que, talvez, faça mais sentido. O mesmo dicionário fala de landraia que é o termo usado em Portugal para uma mulher de má índole, antipática - evidentemente, tudo no sentido irônico, quanto à inspiração para o nome do bar. Bem... um dia vou descobrir...
 
"Landro Carioca" é, como podemos ler em sua página no facebook: "mais que um bar, é uma experiência". O seu blog, de maneira bem-humorada, afirma: Somos uma bar hetero friendly, isso quer dizer que recebemos todas as pessoas e temos um carinho todo especial com o público LGBT. Como um bar posicionado no mercado GLS, esperamos oferecer aos nossos clientes o melhores serviços com qualidade e total atenção ao atendimento. Por sermos um bar GLS na Lapa oferecemos mais que um bar, mas uma experiência carioca. O portal Gay1 faz a seguinte apresentação: Especializado em drinks de cachaça, Vodka e Pisco, o Landro Carioca tem sido um novo point para uma galera descolada, gays, grupos de amigos, tudo isso bem no coração da Lapa, bairro boêmio do Rio de Janeiro.
 
Não é apenas um local de descontração, mas também um importante centro de luta pelos direitos LGBT. Em sua página no facebook encontramos essas declarações:
 
Somos a favor da criminalização da homofobia em todas as suas manifestações (agressões, assassinatos, injúria e qualquer outra ação discriminatória).
 
Denuncie casos de homofobia!!! Não aceite, não tolere nem se cale diante de qualquer situação de discriminação por conta de orientação sexual.
 
Landro Carioca apoia a campanha pelo Casamento Igualitário.
 
Então... Foi uma noite excelente. Valeu muito a pena estar com um grupo (barulhento) de amigos. Entre os gays e hétero, solteiros, casados e recasados, numa verdadeira diversidade. Também com a imensa variedade de bebidas. Pois é, a minha mãe sempre me dizia que não faz bem misturar os drinks...
 
Ah, sim! "Lando Carioca" fica na Avenida Mem de Sá, n° 120, (Lapa) - segundo andar, subindo as escadas coloridas... Funciona de terça a domingo. Durante a semana abre por volta das 20 h. (ou, talvez, um pouco antes, caso não chova).
 
Clique na foto para visualizar melhor (fonte: facebook)
 

5 de novembro de 2013

Preparando o Sínodo

 
Nestes dias correu na mídia a notícia sobre um questionário, enviado pela Santa Sé a todas as dioceses do mundo e relacionado ao Sínodo dos Bispos, previsto para o mês de outubro de 2014 que será dedicado aos "Desafios pastorais da família no contexto da evangelização". Os nossos amigos portugueses do Grupo "Rumos Novos" (organização que trabalha no acompanhamento, oração e partilha com homossexuais católicos portugueses) emitiram a nota à imprensa, expressando o júbilo com o qual receberam tal notícia: Como católicos não podemos deixar de reconhecer a atuação do Espírito Santo no seio da sua Igreja, pois é a primeira vez que o Vaticano pediu tal tipo de opiniões aos católicos de base, pelo menos desde o pós-Vaticano II.
 
Quem acompanha a dinâmica pastoral da Igreja católica aqui no Brasil e - suponho - em outros países da América Latina, sabe que esta metodologia, pelo menos de vez em quando, está sendo aplicada no nível diocesano. Aqui, no Rio, podemos ver isso, por exemplo, na elaboração dos sucessivos "Planos de Pastoral de Conjunto". Há sempre um questionário prévio e, mais tarde, as "assembleias gerais" que recolhem - ao menos em teoria - as conclusões das reuniões no nível paroquial. O que chama atenção é a participação direta dos leigos, principalmente no nível paroquial. As assembleias contam com a presença de 2-3 delegados leigos por paróquia e - evidentemente - com a maciça participação do clero que, no final, elabora o texto conclusivo. Tive a oportunidade de participar de alguns trabalhos em preparação do penúltimo (10°) Plano de Pastoral de Conjunto da Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro e pude constatar que, na prática, nem sempre as ideias e as intervenções diretas dos leigos estavam sendo contempladas. Foi também nessas horas, diga-se de passagem, que senti mais profundamente a falta de uma estruturada Pastoral de Homossexuais. Outra coisa que pode ser observada sempre nessas ocasiões, tanto no nível paroquial, quanto no arquidiocesano, é - digamos - onipresença do típico comodismo, além de todas as dificuldades em compreender as questões propostas. No nível paroquial, antes de serem promovidas as assembleias para reunir a representação de toda comunidade, os questionários são encaminhados aos grupos, movimentos e pastorais que atuam na paróquia. Os fenômenos citados acima (o comodismo, a falta de compreensão) fazem-se presentes já naquele nível básico. Não raramente, o maior problema é o prazo que costuma ficar "em cima da hora", devido à demora em entregar o questionário (porque o padre guardou o papel e se esqueceu dele, ou não deu a menor importância), depois, em reunir as pessoas e, finalmente, em ter a vontade, a coragem, a paciência e a inteligência, para responder a todas as perguntas. Ainda que, em alguns casos, tudo corra bem e tenha sido levado a sério, aquela imensidão de papeis chega à Comissão Arquidiocesana que procura redigir as conclusões que correspondam à maioria das respostas. É claro que, nessas horas, perdem-se algumas ideias. Aí sim, acontece a Assembleia Arquidiocesana, na qual são apresentadas e votadas aquelas conclusões da Comissão. Há possibilidade de entrar com as intervenções que, caso aceitas pela mesa diretora, também estão sendo submetidas à votação. Encerrada a Assembleia, a mesma Comissão elabora o texto final. Lembro-me daqueles trabalhos do 10° Plano de Pastoral de Conjunto que o livrinho ("documento final") tinha-me surpreendido com algumas imprecisões.
 
Escrevi tudo isso para expressar certa preocupação com a aplicação desta metodologia nos trabalhos do Sínodo dos Bispos. Afinal, trata-se agora de uma dimensão incomparável, mundial. Além disso, por mais que se negue a sua existência, a "inquisição", ou pelo menos, a censura, não deixou de funcionar, em todos os níveis da realidade eclesial. A questão torna-se ainda mais delicada por causa de um assunto específico que foi inserido no texto da Santa Sé de maneira bastante corajosa e inédita.
 
Não consegui localizar o questionário na íntegra em nenhum dos sites oficiais da Igreja do Brasil, transcrevo aqui os temas principais do documento e as quatro perguntas referentes às pessoas homossexuais e às uniões entre as pessoas do mesmo sexo, baseando-me em uma fonte de Portugal (aqui).
 
Resta-nos confiar na graça do Espírito Santo e contar com a honestidade de todos os envolvidos neste Sínodo dos Bispos, em todos os níveis, desde agora até a sua conclusão e aplicação na vida prática da Igreja.
 
II Assembleia Geral Extraordinária do Sínodo dos Bispos
DESAFIOS PASTORAIS DA FAMÍLIA NO CONTEXTO DA EVANGELIZAÇÃO
DOCUMENTO PREPARATÓRIO
Vaticano 2013
I – O SÍNODO: FAMÍLIA E EVANGELIZAÇÃO
II – A IGREJA E O EVANGELHO SOBRE A FAMÍLIA
O projeto de Deus Criador e Redentor
O ensinamento da Igreja sobre a família
III – QUESTIONÁRIO
1. Sobre a difusão da Sagrada Escritura e do Magistério da Igreja a propósito da família
2. Sobre o matrimônio segundo a lei natural
3. A pastoral da família no contexto da evangelização
4. Sobre a pastoral para enfrentar algumas situações matrimoniais difíceis
5. Sobre as uniões de pessoas do mesmo sexo
a) Existe no vosso país uma lei civil de reconhecimento das uniões de pessoas do mesmo sexo, equiparadas de alguma forma ao matrimônio?
b) Qual é a atitude das Igrejas particulares e locais, quer diante do Estado civil promotor de uniões civis entre pessoas do mesmo sexo, quer perante as pessoas envolvidas neste tipo de união?
c) Que atenção pastoral é possível prestar às pessoas que escolheram viver em conformidade com este tipo de união?
d) No caso de uniões de pessoas do mesmo sexo que adotaram crianças, como é necessário comportar-se pastoralmente, em vista da transmissão da fé?
6. Sobre a educação dos filhos no contexto das situações de matrimônios irregulares
7. Sobre a abertura dos esposos à vida
8. Sobre a relação entre a família e a pessoa
9. Outros desafios e propostas (vale a pena citar a última pergunta)
Existem outros desafios e propostas a respeito dos temas abordados neste questionário, sentidos como urgentes ou úteis por parte dos destinatários?

3 de novembro de 2013

Entre a cruz e o arco-íris

 
O título do livro de Marília Camargo César faz alusão à expressão "entre a cruz e a espada" e situa-se, de fato, no espaço intermediário que divide as duas realidades, neste caso, a religião cristã e o mundo LGBT. Talvez mais uma frase idiomática ajude a definir o livro: "em cima do muro". A primeira impressão que me ocorreu durante e depois da leitura é que a autora está em cima do muro o que não precisa ser entendido como uma crítica. Ela simplesmente não "puxa sardinha para o seu lado" (para usar mais uma expressão popular), porque não existe o lado dela, nesta questão. Existe sim, mas não pertence ao duelo "Igreja (s) & LGBT". O lado dela é o ser humano, sem outros adjetivos, títulos e sobrenomes. Marília repete várias vezes, nas páginas deste livro, a sua humilde confissão: "eu não sabia... eu precisava estudar, ouvir, ler, estar junto..". Provavelmente essa tenha sido a maior lição da obra que, por sua vez, deixa no ar um sabor de algo incompleto. Também neste caso não é uma crítica, porque o mergulho no mistério do ser humano, em sua religiosidade e sua sexualidade, nunca poderá ser completo, pois trata-se de profundezas impenetráveis por inteiro. Podem e devem ser tocadas essas profundezas e ainda trazidas a um encontro, por mais que tal encontro pareça impossível, ou inútil. Este livro é uma espécie de abre-alas. É, também, mais um livro na minha estante, ao lado de outros autores, como Edith Modesto, James Alison, José Lisboa, José Trasferetti, Klecius Borges, James L. Empereur, Kimeron N. Hardin, Didier Eribon, Nelson Luiz de Carvalho, Betty Fairchild e Nancy Hayward, Márcio El-Jaick, Jean Luc Schwab, Felipe Alface, Daniel A. Helminiak, Amílcar Torrão Filho, M. A. Prado e F. Machado e alguns outros. Faz parte, como todos os outros, da tentativa de estabelecer um diálogo, um conhecimento mútuo, afim de preparar o terreno para futura convivência mais respeitosa e acolhedora.
 
Para quem está acostumado com o pensamento católico, o livro "Entre a cruz e o arco-íris" ajudará compreender um pouco mais a doutrina protestante, pois este é um dos pontos de partida da autora. Pode servir também de inspiração para um trabalho paralelo que inclua os teólogos católicos.
 
Concordo com a opinião de David Santos, autor do blog "Culto diferente" que diz:
 
Minha critica em relação a ele, deve-se ao fato de que, como sempre, os debates resumem-se apenas à cama, não se leva em conta que heterossexuais se unem em matrimonio por muito mais motivos que apenas o sexo, homossexuais também!!  Faltou relatos de casais homoafetivos, cuja união seja consistente como as idealizadas pela igreja, e que conseguem equilibrar sexualidade e religião. Assim como a autora, devia possuir seus preconceitos pelo desconhecimento, a sociedade precisa também saber que há homossexuais que, como muitos heterossexuais, não são promíscuos e querem viver uma vida moralmente sadia em seus relacionamentos. A falta de conhecimento, ainda é a maior fonte de preconceitos!!
 
Por sua vez, Sérgio Viula, um dos entrevistados no livro (e um sábio que tive a honra de conhecer pessoalmente neste ano), em seu blog "Fora do armário", afirma:
 
O livro tem a seu favor duas coisas, pelo menos:
 
1. A tentativa de dar voz as dois lados (ou mais): gente religiosa (a maioria) ou não (como o meu caso); sejam contra ou a favor; gente que é LGBT, e nega-se; gente que é LGBT, e afirma-se com reservas; gente que é LGBT, e afirma-se sem medo de ser feliz; e gente que jamais soube o que é ser LGBT, mas mesmo assim não para de fiscalizar a sexualidade alheia;
 
2. O livro identifica ideias, acontecimentos, comportamentos, mudanças em relação ao tema ao longo da história, tocando em religião (e ausência dela), psicologia, política, estatísticas, testemunhos pessoais de conversão, “des-conversão”, ex-gays, ex-ex-gays, suicídios e crimes motivados por homo-transfobia e seus efeitos, entre outras coisas. Tem muita informação bem sistematizada, tanto do passado como do presente.
 
Bem, vale a pena ler – não como manual de fé e prática. Chega disso!!!! Mas como fonte de conhecimento sobre diversas facetas da mesma questão: a recriminação dos que se arvoram representantes de Deus, da família, dos bons costumes, e os avanços dos direitos humanos na forma dos direitos civis dessas minorias, por tanto tempo discriminadas, renegadas, mal-compreendidas. Apesar do livro cutucar o Movimento LGBT em diversos momentos, não deixa barato para os fundamentalistas.

2 de novembro de 2013

A "objetividade católica"

 
Dicionário: Objetividade é a qualidade daquilo que é objetivo, externo à consciência, resultado de observação imparcial, independente das preferências individuais. No campo da ciência, objetividade é a propriedade de teorias científicas de estabelecer afirmações inequívocas que podem ser testadas independentemente dos cientistas que as propuseram. No campo do jornalismo objetividade é um atributo de um texto final. Para que um texto seja considerado objetivo, ele deve ser claro e conciso, além de apresentar um ponto de vista neutro.
 
Retorno à reflexão sobre o diálogo entre as pessoas LGBT e os católicos (ainda que nem todos do primeiro grupo tenham a vontade de participar de um diálogo semelhante e, também, ao falar de católicos, não me refiro necessariamente à Igreja enquanto instituição). De um lado temos a incrível abertura, bondade e desejo de promover a "cultura do encontro", por parte do Papa Francisco. Simultaneamente (e, muito provavelmente, em reação à postura do Papa) aparecem declarações cada vez mais diretas, antipáticas e, mesmo, hostis, relacionadas aos homossexuais e pronunciadas por aqueles que se declaram católicos fiéis, tradicionalistas, ortodoxos (ainda que o último termo nada tenha a ver com a Igreja Ortodoxa, mas trata-se do significado literal da palavra "ortodoxia", isto é, a fidelidade). Recentemente citei aqui alguns exemplos dessas declarações (1, 2, 3, 4, etc.),  inclusive com os comentários de leitores (igualmente "ortodoxos") que mostram nitidamente o efeito que elas produzem. Por enquanto é apenas um efeito verbal, mas - como nos mostra a história - o caminho entre as palavras inflamadas e atitudes agressivas é muito curto.
 
Não sou perito no direito penal, mas tenho a impressão de que alguns casos de "propaganda católica" estejam beirando o limite do crime de incitação à violência, como é o caso de equiparar a homossexualidade à pedofilia. Os profissionais afirmam que o direito positivo brasileiro cataloga como crime a incitação pública à pratica de qualquer fato delituoso, como também o é a apologia do crime, que se consubstancia na incitação ao crime. Induzir é persuadir, aconselhar, argumentar, pressupõe a iniciativa à prática e pode fazer-se por qualquer meio. Incitar é instigar, provocar, excitar a pratica do crime, por qualquer meio ou de qualquer forma, sem necessidade de sê-lo pelos meios de comunicação social ou de publicação. O crime é formal, independe do resultado ou da consequência da incitação e equipara-se à própria prática. Napoleão e Hitler, como tantos outros seres ignóbeis e cruéis, que emporcalharam a Terra, pretenderam ou ainda pretendem mudar a face do mundo, matando e violentando o homem.
 
O mais curioso - e ao mesmo tempo triste - é o fato de que os mesmos católicos que não economizam a criatividade no uso de adjetivos que expressam o seu desprezo aos homossexuais, tornam-se, repentinamente, "cordeiros levados ao matadouro", quando chega até eles qualquer crítica relacionada à Igreja. Para entender melhor essa ideia, proponho em seguida um exercício escolar. O texto original é composto de frases mais emblemáticas, tiradas do site do Padre Paulo Ricardo e de uma propaganda que recebem os assinantes daquele site.
 
Primeiro, vou transcrever a frase original:
 
Como dizia o servo de Deus Fulton Sheen, “não existem 100 pessoas que odeiam a Igreja Católica, mas existem milhões que odeiam aquilo que eles pensam ser a Igreja Católica.”
 
...em seguida, substituo o termo "Igreja Católica" por "homossexuais":
 
“não existem 100 pessoas que odeiam os homossexuais, mas existem milhões que odeiam aquilo que eles pensam ser os homossexuais.”
 
A Igreja, diga-se de passagem, contribui bastante para criar uma específica imagem dos homossexuais. Agora vai a outra afirmação (na qual, desta vez, não precisa trocar nenhuma palavra):
 
Em um mundo onde as aparências importam mais que a realidade, não são poucos os indivíduos à procura de um saber superficial, alcançado apenas para demonstrar posição social ou superioridade em relação às outras pessoas.
 
As frases seguintes são:
 
Importa apenas arrumar oportunidade para destilar um ódio quase que irracional à Igreja. Qualquer pedaço de pau serve para bater nela.
 
...e, em versão talvez ainda mais realista:
 
Importa apenas arrumar oportunidade para destilar um ódio quase que irracional aos homossexuais. Qualquer pedaço de pau serve para bater neles.
 
O texto original faz, também, referência aos estudos acadêmicos (anticlericais) e constata que, certamente, o propósito de quem estuda não seja a procura da verdade, mas a difamação e a propaganda suja. Será que não são os mesmos termos que podemos aplicar ao ponto de vista (e de ação) da maioria dos católicos (e da própria instituição), em relação aos homossexuais?
 
A observação mais curiosa está aqui: No culto secular à diversidade, nenhum preconceito é tolerado, a menos que o preconceito seja dirigido à religião – e, de modo particular, à religião cristã. Neste caso, não só é permitido ser intolerante, como a própria "classe intelectual” faz questão de estimular na juventude esta espécie de intolerância.
 
Falar de um "culto secular à diversidade"... já sabemos do que se trata. Não é, porém, a própria Igreja que faz questão de estimular a intolerância, em sua espécie particular, isto é, voltada contra os homossexuais e a sua luta pelos mais legítimos direitos?
 
Enfim, mais uma vez chego à conclusão de que o diálogo entre os católicos e as pessoas homossexuais é algo difícil-dificílimo (como diria a Valdirene da novela "Amor à vida")...

1 de novembro de 2013

Guerra santa ou suja


Faço aqui uma analogia, tendo em vista as manifestações que vem acontecendo nas maiores cidades do Brasil, desde os meados deste ano. É difícil não concordar com a opinião da maior parte da mídia (sem esquecer de seu jeito tendencioso em apresentar os fatos) de que as ações dos grupos de vândalos, acabam desmoralizando a luta democrática e legítima de quem quer que seja. Independentemente das intenções da mídia e de toda a sua típica distorção da verdade, neste caso concordo com essa opinião. A conclusão está clara e serve para outros contextos: como desmoralizar uma luta justa e legítima? Criar um foco diferente e atrair a ele todas as atenções, usando simultaneamente o artifício chamado "generalização". Assim, as manifestações tornam-se ruins, porque destroem o patrimônio público e privado, atrapalham a vida dos cidadãos inocentes e honestos, portanto precisam ser repudiadas pela sociedade em geral.
 
Vejamos agora o outro exemplo deste mesmo fenômeno que consiste em desmoralizar uma luta legítima. O portal católico "Veritatis splendor", através de seu perfil no facebook, afirma:
 
Quando a propaganda Gay começou por volta de uns 10 anos, já falávamos que o próximo passo seria a defesa da Pedofilia. Disseram que estávamos malucos... Pois aí está. E isso não é porque somos profetas. Apenas sabemos o que as organizações que promovem isso querem: a descristianização do mundo. Tudo que o Evangelho defendeu, por eles será combatido. Tudo o que o Evangelho condenou, por eles será exigido de nós. Simples, assim!
 
Em seguida, o mesmo perfil, remete o leitor a uma matéria, publicada no site ACI Digital (serviço de notícias em Português do grupo ACI, encabeçado pela Agência Católica de Informações, reconhecida juridicamente como uma associação educativa sem fins lucrativos vinculada à Igreja Católica): intitulada Insólito: Psiquiatras dos EUA aceitam a pedofilia como "orientação sexual". De acordo com o texto, a Associação Americana de Psiquiatria dos Estados Unidos (APA) aceitou dentro da quinta edição do seu Manual de Diagnóstico e Estatística das Desordens Mentais a "orientação sexual pedofílica", e a diferenciou da "desordem pedofílica".
 
Seja qual for a origem e a veracidade dessa notícia, fica muito mais fácil apoiar e divulgar a ideia, lançada em 2010, que diz (no citado site "Veritas splendor"): Pedofilia e homossexualismo: de mãos dadas. O autor do texto, Pe. Luiz Carlos Lodi da Cruz, escreve:
 
Homossexualismo e pedofilia estão de tal modo entrelaçados que é difícil, até no plano dos conceitos, separar um do outro. (...) A relação homossexualismo-pedofilia é também confirmada pelo psiquiatra americano Richard Fitzgibbons, especialista no tratamento de sacerdotes que cometeram abusos contra menores. Diz ele: “todos os sacerdotes que tratei que estão envolvidos sexualmente com crianças estiveram envolvidos previamente em relações homossexuais adultas”. Para o psicólogo José María Amenós Vidal da Universidade Central de Barcelona (Espanha), há evidência científica que corrobora o vínculo entre homossexualismo e pedofilia, a partir de pesquisas feitas com primatas em cativeiro. (...) O combate ao homossexualismo e a pregação da cultura da castidade são dois motivos pelos quais a Igreja, e em particular o atual Papa (o texto é de 2010, trata-se, portanto, do Papa Bento XVI), deveria ser condecorada como benfeitora da humanidade e protetora dos pequeninos. Ao contrário, o combate à castidade e a promoção do homossexualismo – bandeiras defendidas pelo governo Lula mais do que qualquer outro – constituem um grande serviço à difusão da pedofilia.
 
Repito: seja qual for a autoria e a veracidade dessas notícias, estamos diante de um golpe baixo e desonesto. Os homossexuais, os ativistas dos movimentos LGBT, em sua maioria esmagadora, estão totalmente contra a pedofilia. Os pedófilos, infelizmente, encontram-se em todos os ambientes sociais, desde o clero católico e pastores evangélicos, no meio dos professores e todo tipo de profissionais, bem como, em sua maioria, dentro da própria casa. Estão também no universo LGBT. Do mesmo jeito, porém, como a Igreja Católica levanta a voz de autodefesa e contesta a associação direta entre o clero e a pedofilia, eu quero questionar as ideias simplistas, injustas e difamatórias que associam a homossexualidade à pedofilia. A pedofilia é crime e gravíssimo pecado. Entretanto, assim como apenas alguns padres são pedófilos, também alguns homossexuais o são. Igualmente, alguns homossexuais são ateus - não raramente por terem sofrido uma longa e pesada discriminação por parte dessa ou daquela Igreja cristã. Os homossexuais, porém, não têm por seu princípio, a "descristianização do mundo", como afirma o texto acima. Pelo contrário, muitos ainda estão procurando os caminhos de diálogo e de aproximação entre a própria identidade homossexual e a fé cristã.
 
Quem, porém, lê as conclusões "católicas", citadas acima, terá muito mais facilidade em apedrejar os "perversos veados, pederastas e pedófilos", em nome de Jesus e em nome de uma "purificação da sociedade”.